A lagoa do silêncio

Dos municípios às águas, da pesca ao turismo, a beleza natural da lagoa de Araruama é prejudicada por resíduos sólidos e hídricos lançados em sua extensão. Sua cor já não é a mesma. — como diz o velho ditado: “tudo em excesso faz mal”, até os nutrientes.

A lagoa banha seis cidades da Região dos Lagos: Saquarema, Araruama, Iguaba Grande, São Pedro da Aldeia, Cabo Frio e Arraial do Cabo e inclui, em sua bacia hidrográfica, o município de Rio Bonito. Segundo a perita ambiental Ana Maria Jardim, antes do crescimento populacional da Região dos Lagos, a laguna já foi considerada um lugar de lama medicinal por possuir uma boa quantidade de alcalinidade e vários minérios. Também favoreceu a sobrevivência de índios cerca de dois mil anos atrás. Hoje, a atual realidade da maior hipersalina do mundo é bem diferente.

Visitantes chegam na alta temporada para aproveitar o prazer tropical dos municípios que há em torno. Logo, mais esgoto é jogado no mar, onde se reúnem os causadores da supernutrição das águas: nitrogênio, nitrato fosfato e coliforme fecal. Eles são os minerais de que as microalgas marinhas, invisíveis a olho nu, se alimentam, multiplicando-se e consumindo mais oxigênio. Como explica o biólogo Eduardo Pimenta, esse processo é um fenômeno chamado de eutrofização, e provoca a mortandade de peixes, o que, consequentemente, dificulta a pesca.

O biólogo ainda explica que algumas comunidades de algas são oportunistas, principalmente à noite, pois se proliferam em excesso e inibem o crescimento de outras, o que dá uma coloração diferente na lagoa, como o vermelho e o marrom, além de desequilibrar o meio ambiente e comprometer a balneabilidade, ou seja, a água não fica propícia para banho, turismo e lazer, impactando na pesca e na economia. Durante o dia, quando se pode ver a água calma, as algas realizam fotossíntese e liberam oxigênio no mar, que passa para a atmosfera e fica disponível para os outros seres vivos. Sendo assim, essas algas são o verdadeiro “pulmão do mundo”.

“O pessoal, faz a ligação de fossa, filtro e sumidouro, e o que entrar, já está limpo. Só que as pessoas não querem ter esse trabalho, precisam usar ligações clandestinas, jogando nos canais ou no que sobrou dos rios. Saneamento é saúde. Se o saneamento está precário, a saúde também vai estar. É uma coisa ligada à outra”, afirma a perita.

De acordo com a engenheira civil Gessica Bueno, é muito comum pessoas confundirem a rede de esgoto com a pluvial. “A rede pluvial é para água da chuva e não recebe nenhum tipo de tratamento. Por isso, se ligar o esgoto nesta rede, ele irá direto para algum rio da cidade”, alerta.

Sem o tratamento correto, o esgoto pode prejudicar a saúde e destruir o ecossistema. O detergente que desce com a água, por exemplo, cria uma camada sobre os rios que impede a oxigenação e mata a vida aquática do local. A rede de esgoto tem como destino final a estação de tratamento. Por isso, é indispensável que esteja ligado na rede para evitar a poluição do ambiente e a proliferação de doenças. Assim como a água da chuva deve ser ligada na rede pluvial para não sobrecarregar o esgoto.

A imensa lagoa de Araruama continua a ser um recanto paradisíaco, onde pescadores e velejadores vão para contar histórias, mas, para mantê-la viva e produtiva por mais tempo, seu futuro depende de uma sociedade consciente sobre o saneamento básico e do cuidado dos comércios locais, que ainda jogam esgoto nos mares. Os órgãos públicos e empresas privadas devem fazer um trabalho de conscientização e orientação, para que problemas gerados pela falta de conhecimento da população ou pela má gestão dos serviços sejam solucionados.