A pesca em Arraial do Cabo, tradicionalmente dominada por homens, ganha um novo capítulo com a atuação das associações e cooperativas de pescadoras mulheres, que vêm conquistando espaço no setor de forma artesanal. No município, tanto a Cooperativa Mulheres Nativas, localizada na Praia Grande, quanto a Associação dos Pescadores Artesanais no Parque das Garças Integrada Artesãs – Apescarpegin, de Monte Alto, que não é um local unicamente de mulheres pescadoras, mas tem como associadas muitas delas – fazem o beneficiamento dos peixes pescados por elas para fins comerciais.
Zenilda Maria da Silva é ex-presidente da Cooperativa Mulheres Nativas e uma pescadora apaixonada pela restinga com uma vida inteira dedicada ao mar. Ela encontrou na pesca uma forma de empoderamento e união para as mulheres locais do município através da cooperativa.
Com isso, a pescadora conta que o local começou com a ideia de explorar a pesca e a recuperação de áreas degradadas. Ele foi fundado em 2014 e oficializado em 2016, mas tempos depois passou a focar majoritariamente na pesca artesanal e no beneficiamento do pescado.
A cooperativa atualmente conta com 23 mulheres e além da pesca, elas se dedicam ao processamento dos pescados, para transformar em produtos como quibes, nuggets, almôndegas e hambúrgueres destinados à merenda escolar. Zenilda afirma que nem todas vão ao mar, mas todas são pescadoras.

“Em torno de 12 hoje estão ativas. Algumas não pescam, já não pescavam mesmo, outras pescam, ainda vamos ao mar. Não com a função de cooperativa, mas ainda vamos ao mar mesmo. E a gente tem que entender também que hoje, diante da lei, pescadora não é só aquele que vai para o mar também”, pontuou.
Aos finais de semana e feriados, a cooperativa abre suas portas como restaurante, oferecendo uma culinária tradicional com foco em frutos do mar. No entanto, embora tenha conquistado títulos culinários, Zenilda aponta que os desafios atuais da cooperativa incluem a necessidade de uma sede própria. O imóvel alugado onde opera a cooperativa limita a obtenção de certos certificados e selos que permitiriam expandir a comercialização.
“Hoje, tudo que ganhamos em editais e compensações ambientais investimos no imóvel alugado. Queremos nossa sede para obter o selo necessário para vender nossos produtos para fora do município e do estado”, explicou Zenilda.
A pescadora destaca ainda que especialmente no início da atuação, as mulheres pescadoras, enfrentaram o machismo presente no setor. “No passado, era complicado. Ouvíamos muitas piadas. Hoje, é até tranquilo, mas ainda encontramos resistência”, disse.
Inclusão e diversidade na Apescarpegin
Com uma atuação parecida com a da Cooperativa Mulheres Nativas, a coordenadora geral da Apescarpegin, Luciana Oliveira Machado, afirma que mesmo que a associação seja compartilhada entre pescadoras e pescadores, uma das preocupações do local é que todos sejam tratados sem preconceitos na área.

“A pesca engloba tanto mulheres quanto homens, só que nós temos mais porcentagem de mulheres do que de homens. Ela [a associação] é um pouco diferente do formato de outras instituições. E dentro dessa instituição a gente trabalha com todos os que representam a pesca”, disse.
A associação, além da pesca, também possui outros projetos sociais e ambientais, onde realizam ações voltadas para filhos de pescadores e a comunidade local em parcerias com organizações privadas, já que atualmente não possuem auxílio público.
“Trabalhamos com os filhos do pescador, com a filha do pescador, que é o grupo jovem, trabalhamos também com as mulheres da pesca, tanto as que só beneficiam, as que vendem o pescado, a pescadora artesanal, toda a cadeia produtiva da pesca artesanal, explicou Luciana.
A associação também tem uma área de atuação para mulheres produtoras de biojóias, produzidas no local a partir da pesca e comercializadas tanto na região quanto em cidades vizinhas.

Expectativas futuras
Ambas as lideranças destacam a importância do cooperativismo e associativismo como formas de superar os desafios e conquistar novos espaços.
Zenilda incentiva a preparação das pescadoras através de cursos e oficinas, apoio que não possuem atualmente, para que possam conseguir um local próprio e afirma que pretende fazer com “Que as pessoas possam ir lá [na cooperativa], não apenas para comer uma comida que vai ser barata e boa, mas para entender o que é o turismo de verdade, o que seria o turismo comunitário dentro de uma cidade turística como Arraial do Cabo”.
O que Luciana também reforça, ao apontar que vê a inclusão e a diversidade como pilares fundamentais para o futuro da pesca artesanal, e destaca que “Queremos um turismo de base, onde os turistas venham para conhecer a verdadeira história da nossa cidade, e não apenas para consumir”, conclui.