A Prefeitura de São Pedro da Aldeia entrou na Justiça para pedir a reintegração de posse do imóvel onde funciona a Associação Espírita do Caboclo Cobra Coral, no bairro Balneário das Conchas. Além de ser um local de culto de religião de matrizes africanas, o lugar presta serviços sociais voltados para idosos e crianças do bairro.
Entre as ações realizadas no local estão a distribuição de cestas básicas, distribuição de kit maternidade para gestantes em vulnerabilidade, aulas de reforço para crianças da comunidade e ações sociais para emissão de documentos, além de um centro de atividades para qualidade de vida.
Agora, este serviço pode ser prejudicado porque o prefeito Fábio do Pastel moveu a ação de despejo do Centro, que funciona no local desde 1995, quando o então prefeito Rodolfo Pedrosa decretou a sessão do espaço. Ainda na ação movida na Justiça, a Prefeitura diz que o local não estaria sendo utilizado para os fins autorizados.
A concessão de espaços públicos para entidades religiosas é uma prática legal, e acontece em todo o país. No ano de 2003, o prefeito Paulo Lobo cedeu uma área de 424 metros quadrados no bairro Balneário das Conchas, na mesma rua da Associação Espirita, para a construção de uma igreja evangélica.
Em 2005, uma lei aprovada pela Câmara de Vereadores de São Pedro e sancionada pelo prefeito deu o título de utilidade pública municipal à sociedade beneficente, sem fins lucrativos.
A ação de despejo foi movida pela Prefeitura no ano de 2021, já no governo do prefeito Fábio do Pastel. Em 2022, o prefeito assinou a permissão de uso de bem público para Mitra Arquidiocesana De Niterói, instituição ligada à religião católica, com 2.299 metros quadrados, no bairro Balneário das Conchas, para o funcionamento da Capela Nossa Senhora Aparecida.
A ação na Justiça vem à tona na mesma semana em que o prefeito de São Pedro fez um discurso com tom de intolerância religiosa durante a Sessão Solene de 406 anos de fundação da cidade, realizada pela Câmara de Vereadores. Durante a fala, Fabio do Pastel expressou o desejo de que todos os eventos da cidade fossem ligados ao segmento gospel.
Na quarta-feira (17), o prefeito fez uma transmissão ao vivo nas redes sociais explicando que, na verdade, quis se referir à tranquilidade dos eventos gospel, que costumam terminar cedo, sem confusão e algazarra, facilitando o trabalho da gestão pública. Mesmo assim, pediu desculpas para quem se sentisse ofendido com a fala anterior.
O que dizem as partes
Entramos em contato com a comunicação da prefeitura de São Pedro, pedindo explicações. Segundo o órgão, por meio da Procuradoria-geral do Município, “a referida área onde funciona a Associação Espírita foi desapropriada pelo município para construção da Casa do Idoso, conforme Decreto 618/1995.” Veja a resposta na integra:
Fonte Certa – Por qual motivo a prefeitura quer reintegrar o espaço?
A Prefeitura de São Pedro da Aldeia, por meio da Procuradoria-geral do Município, esclarece que a referida área onde funciona a Associação Espírita foi desapropriada pelo município para construção da Casa do Idoso, conforme Decreto 618/1995.
Após a desapropriação, o município celebrou termo de permissão de uso com a entidade Pai Joaquim de Angola, que se comprometeu a construir a CASA DO IDOSO e a prestar o acolhimento de pessoas idosas e carentes.
Ocorre que, após vistoria, o município identificou que a entidade Pai Joaquim de Angola, que celebrou o termo referido, repassou o imóvel a outra associação espírita, que nunca desenvolveu as atividades pelo qual a primeira tinha se comprometido a realizar e vem utilizando o bem público municipal sem dar a destinação que motivou a desapropriação.
FC- A prefeitura quer o espaço para fazer o que?
Para dar cumprimento ao Decreto 618/1995 e realizar o acolhimento de pessoas idosas e carentes no município.
FC – A prefeitura alega que não presta o serviço para que se predispõe isso seria algum tipo de intolerância por ser uma associação de matriz africana.
Reforçamos que a motivação da reintegração foi demonstrada acima e não tem qualquer relação com intolerância religiosa. Tem por objetivo destinar o bem público a sua finalidade, sob pena de violar o princípio da legalidade, pois a desapropriação foi feita sob a justificativa de acolher idosos carentes, além disso, é uma demanda que vem aumentando no município em razão do envelhecimento da população.
FC – A prefeitura quer reintegrar a posse do imóvel mesmo sendo esse de utilidade pública? A Câmara tem ciência desse fato?
O reconhecimento de utilidade pública conferido a referida entidade não guarda relação com o motivo da reintegração, tendo em vista que o bem público deve atender às demandas do município independentemente da religião.
Quanto à ciência da Câmara, a Procuradoria esclarece que é competência do prefeito administrar os bens públicos e dar-lhes a melhor destinação observado o interesse público.
O decreto de desapropriação deu ciência a todos os munícipes das razões da desapropriação e se trata de ato exclusivo do chefe do Executivo, que não depende de anuência da Câmara.
Entramos em contato, também, com a Associação Espírita do Caboclo Cobra Coral, que preferiu não comentar os fatos.