Na última semana de 2023, a Prefeitura de São Pedro da Aldeia realizou uma licitação para contratar serviços de segurança não-armada. A estimativa do valor global do certame foi de R$ 2.386.473,60. A licitação não chamaria a atenção se as informações que o Portal Fontecerta.com recebeu não apontassem que a própria Guarda Municipal enfrenta severos problemas estruturais e de pessoal. A Prefeitura respondeu aos nossos questionamentos, disponíveis no fim deste texto.
Sob condição de sigilo, servidores da Guarda Municipal apontaram diversas fragilidades dentro da corporação. A falta de efetivo é uma delas. São apenas 112 agentes, quando deveriam ser 300. Outra é a própria sede da Guarda. A atual gestão herdou uma sede própria. Porém, devido a um incêndio, os agentes não puderam mais utilizar o local. A promessa de construção de uma nova sede ainda não se concretizou e, desta forma, a Guarda foi para um local provisório, que apresenta deficiências. Falta de camas, problemas no ar-condicionado e presença de mosquitos estão entre as deficiências do local.
De acordo com a denúncia que a reportagem recebeu, a casa onde funciona a Guarda Municipal custa R$ 9 mil por mês aos cofres públicos. Só que o espaço, apesar de ficar no Centro, está fora do contexto operacional e de visibilidade. Assim sendo, isso pode facilitar ações de oportunistas.
Além disso, os servidores de segurança pública, que trabalham 24 horas, não recebem nem a dignidade do fornecimento de alimentação e limpeza adequadas, de acordo com as denúncias. Os agentes enfrentam o cenário de dificuldade para encontrar lugares para comer fora, por conta da localização da sede, e também em obter passagens de ônibus para chegar trabalhar.
Problemas com equipamentos e viaturas
A situação das viaturas e equipamentos também é crítica, segundo apurou a reportagem. Os rádios-transmissores, por exemplo, foram doações. Já usados, eles não têm autonomia de bateria, que dura cerca de 8 horas. Com isso, os agentes podem ficar na rua sem comunicação com a base. Além disso, os veículos não recebem a manutenção que deveriam ter e apresentam até mesmo pneus carecas.
Um caso emblemático é uma viatura que o município alugou e está sem condições de uso desde o fim de 2022. Mesmo após problemas, a empresa responsável pelo aluguel não realizou os devidos consertos ou substituições e a picape passou 2023 quase inteiro fora de circulação. No entanto, segundo fontes da reportagem, o aluguel do veículo continuou sendo pago normalmente.
Comunicação do TCE
Em junho de 2023, o Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) deliberou sobre uma licitação que a Prefeitura de Quissamã promoveu bem similar a que São Pedro da Aldeia fez no fim do ano. Ao falar sobre supostas irregularidades no certame, a relatora Marianna Montebello Willeman apontou a necessidade de um Plano Municipal de Segurança Pública.
Em comunicação enviada a todos os municípios sob jurisdição do TCE, a relatora definiu que é necessário a “elaboração do Plano Municipal de Segurança Pública, alinhado ao Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social 2021-2030 (Decreto Federal nº 10.822/2021), observando o prazo máximo para sua implantação (art. 22, § 5º da Lei Federal nº 13.675/2018), sob pena de não poderem receber recursos da União para a execução de programas ou ações de segurança pública e defesa social”.
Entre as demandas que agentes da Guarda Municipal de São Pedro da Aldeia têm, está justamente o tal plano. Além disso, a instituição carece, segundo seus servidores, de um Fundo Municipal de Segurança Pública para receber verbas e um Conselho Municipal de Segurança Pública representativo.
O que diz a Prefeitura?
A reportagem entrou em contato com a Prefeitura com relação às possíveis irregularidades. Questionamos qual a justificativa para a realização de uma licitação milionária para contratação de serviços de segurança não-armada, considerando as demandas e necessidades apontadas pelos servidores da Guarda Municipal. Em nota, a Prefeitura de São Pedro da Aldeia informou que a justificativa “encontra-se devidamente apresentada no processo”.
“Quanto ao efetivo da Guarda Civil Municipal, o município se prepara para a realização de um concurso público para diversos cargos da Prefeitura, mas diante da necessidade imediata, optou-se pelo reforço com a contratação de uma empresa, no mesmo molde que foi feito no ano passado para atender todas as secretarias que realizam eventos, além da alta temporada”, pontuou.
Logo depois, questionamos quais medidas a Prefeitura pretende adotar para sanar os problemas estruturais e garantir melhores condições da guarda. “De acordo com a Secretaria de Segurança e Ordem Pública, existem diversos processos em andamento para melhorar a estrutura e operacional da GCM. Por exemplo, a secretaria aguarda a entrega da base móvel pelas empresas ganhadoras das licitações, além de grades e equipamentos não letais. A Prefeitura irá licitar, ainda, a construção da sede e demais processos importantes”, explicou a Prefeitura.
Prefeitura de São Pedro fala sobre aluguel da sede da Guarda e responde comunicação do TCE
Outro questionamento foi com relação ao contrato de aluguel da sede atual da Guarda Municipal. Nesse sentido, o município disse que o aluguel do imóvel passou pelo procedimento específico, que inclusive atestou a economicidade. “Trata-se de uma sede provisória até que seja licitada a construção da sede própria. Os valores estão dentro do praticado no mercado”, afirmou.
Por fim, questionamos sobre a comunicação do TCE-RJ. De acordo com a Prefeitura, a gestão está “trabalhando na regularização de toda legislação”. “Inclusive, foi pioneira na elaboração do Estatuto da Guarda Civil Municipal. Em relação ao Plano de Segurança e Defesa Social, encontra-se em estudo para adoção das medidas de elaboração do mesmo. É importante ressaltar que o processo não atrapalha o município na captação de recursos para a segurança pública”, finalizou.