O Conselho Municipal de Política Cultural (CMPC) segue sendo atravessado por problemas em São Pedro da Aldeia. Pouco mais de um ano após a apresentação dos 36 representantes do grupo, em 18 de agosto de 2023, três membros da categoria da sociedade civil já deixaram os cargos. Desde julho, as cadeiras de Artes Cênicas e de Cultura LGBTQIA+ e Inclusiva estão em vacancia de representação titular e suplente, infringindo uma das principais regras do CMPC: manter “composição paritária entre Poder Público e Sociedade Civil”.
Segundo as informações sobre órgão municipal disponibilizadas no site da prefeitura aldeense, a Secretaria Municipal de Cultura (SEMUC) deveria garantir que o grupo sempre mantivesse 9 membros titulares e respectivos suplentes para as duas categorias. No entanto, uma fonte ligada ao setor cultural aldeense – que preferiu não se identificar – afirmou que as ações necessárias estão sendo deixadas de lado e a reestruturação do conselho está sendo “empurrada com a barriga”.
A fala da fonte se refere ao não cumprimento da portaria divulgada pela SEMUC em 4 de julho, na edição nº 1273 do Boletim Informativo Digital da Prefeitura. No documento, o Secretário Municipal de Cultura, Thiago Marques, convocou os conselheiros representantes da Secretaria pelo poder público, Cleisemery Campos da Costa e Josephane Lima, a titular da cadeira de Patrimônio Material e Imaterial, Marlúcia Soares dos Santos, e o suplente da cadeira de Cultura Indígena e Afro-Brasileira, Elson da Silva Carvalho, para dar início ao processo de eleição suplementar.
Inicialmente, o grupo deveria realizar o pleito entre 5 e 31 de julho e, em caso de necessidade, poderia prorrogar o prazo por mais trinta dias. A prorrogação foi utilizada e estabelecia que a votação acontecesse até 30 de agosto. No entanto, ainda de acordo com a fonte, nenhuma ação foi tomada e a sociedade civil não recebeu informações sobre o processo.
“Como estamos em período eleitoral, não tem informação [sobre a eleição suplementar] em lugar nenhum. Até agora não teve nenhuma data apresentada ou planejamento de inscrições. Sequer está publica a informação de que tem duas cadeiras em vacância e a portaria não foi renovada. A informação foi passada apenas da secretária do conselho para os conselheiros, mas isso não está público em lugar nenhum”, disse a fonte que ainda afirmou que a falta de ação do município para solucionar o problema deixa a categoria civil em desvantagem.
No município aldeense, o Conselho é o principal espaço de participação social institucionalizada na estrutura do Sistema Municipal de Cultura (SMC). O órgão deveria atuar como articulador das políticas públicas culturais do município aldeense, exercendo funções consultivas, normativas e fiscalizadoras – que ficam defasadas sem representação em duas esferas fundamentais para a cultura da cidade.
O portal Fonte Certa entrou em contato com a Prefeitura para entender o motivo da portaria não ter sido cumprida e nem renovada pela SEMUC e aguarda os esclarecimentos. A matéria será atualizada em caso de resposta.
Entenda a saída dos conselheiros
Antes ocupadas por Carolina Lira e Gabriella Chaffin (titular e suplente de Artes Cênicas) e Michael Silva Garcia (titular de Cultura LGBTQIA+ e Culturas Inclusivas), as cadeiras da sociedade civil foram renunciadas pelos próprios conselheiros por motivos variados.
As integrantes do segmento de Artes Cênicas precisaram deixar o CMPC devido a ligações com a política aldeense. A suplente da cadeira é candidata a vereadora nas Eleições Municipais de 2024; enquanto a titular precisou renunciar a vaga no conselho após aceitar um cargo comissionado na prefeitura de São Pedro da Aldeia.
De acordo com o regimento do conselho, “nenhum membro representante da Sociedade Civil, titular ou suplente, poderá ser detentor de cargo em comissão ou função de confiança vinculada ao Poder Público”. Por isso, a continuação da representante suplente Carolina Lira se tornou inviável.
Já o conselheiro titular de Cultura LGBTQIA+ e Culturas Inclusivas solicitou o desligamento ao próprio Secretário Thiago Marques através de uma carta. As motivações acerca da renúncia não foram divulgadas.
Se tivessem continuado no cargo, os conselheiros teriam mais um ano de atuação no CMPC, com possibilidade de renovação por mais dois anos.
Histórico de problemas recorrentes
Questão recorrente em São Pedro da Aldeia, o trabalho da sociedade civil do CMPC enfrentou diversos problemas nos últimos dois anos. Em 2022, o conselho chegou a ser dissolvido pela prefeitura e reestruturado através de uma nova eleição. E no início deste mês, em 6 de setembro, voltou a ser pauta na coluna “Direto da Fonte” do portal Fonte Certa, após o grupo ter sido inesperadamente convocado a uma reunião virtual mediada pelo Ministério Público Federal.
Durante a reunião, o MPF solicitou esclarecimentos sobre as ações de fiscalização da aplicação dos recursos, metodologia, critérios de nomeação, cadeiras vagas, problemas de comunicação e, por fim, uma nova dissolução do grupo.
Segundo a fonte da matéria, que esteve presente no encontro virtual que durou mais de duas horas, foram solicitados à prefeitura aldeense documentos que fundamentam a dissolução do conselho, além de esclarecimentos sobre a exigência de experiência mínima de 5 anos com o setor cultural para integrar a sociedade civil – prática considerada excludente – e comprovação de envio do ofício da eleição suplementar aos membros da sociedade civil.
Além disso, foi proposto um acordo entre a prefeitura aldeense e a sociedade civil para que demandas de reestruturação do conselho fossem encaminhadas e acompanhadas pelo grupo junto ao MPF – determinação recusada pela administração municipal mesmo com a tentativa de mediação do procurador Leandro Mitidieri.
Em nota, o Fórum Permanente de Política Pública alegou que “a proposta do MPF foi rechaçada por representantes da Secretaria Municipal de Cultura”.
Agora, o inquérito civil segue o processo de investigação. O procurador se comprometeu em se debruçar sobre a legalidade da dissolução e deverá emitir recomendações formais à prefeitura. Caso essas orientações não sejam seguidas, ele poderá ingressar, ainda, com uma ação judicial de dissolução ou reestruturação do conselho.
Para os agentes culturais do município, a atuação do MPF representa uma esperança de que as irregularidades sejam finalmente corrigidas, trazendo transparência, responsabilidade e cumprimento das exigências do CMPC.
Outras polêmicas
Relembre outra polêmica envolvendo o Conselho Municipal de Política Cultural na matéria “Ex-conselheiro aponta perseguição após posicionamento contra dissolução de Conselho de Cultura de São Pedro da Aldeia“.